Mineração: benefícios ESG e áreas indígenas
Sempre em pauta, a questão das terras indígenas tem ganhado destaque com o Projeto de Lei do Marco Temporal, que trata da ocupação de terras indígenas (PL 490/07), recentemente aprovado na Câmara dos Deputados e que será votado também no Senado. O assunto seguirá em debate porque ainda será votado no Supremo Tribunal Federal (STF).
De forma resumida, o texto prevê que, para serem consideradas terras indígenas, os povos originários deverão comprovar que, na data de promulgação da Constituição Federal (CF) – 1988, já habitavam as áreas em que vivem, de forma permanente, para uso de suas atividades produtivas e para a reprodução física e cultural. Em caso de não haver comprovação, as terras hoje ocupadas pelos indígenas poderão ser alvo de usos não permitidos pela CF, chegando no limite de perda da posse e uso fruto. O debate teve diversas manifestações contra e a favor de muitos grupos, incluindo os indígenas e não-indígenas.
Suzi Huff Theodoro Geóloga e professora da UnB, , que também é uma das diretoras da Federação Brasileira de Geólogos (Febrageo).
Ela é coordenadora e uma das autoras do livro – Mineração em terras indígenas – desenvolvimento para quem? – lançado pela Febrageo com apoio do Sistema Confea/Crea (leia mais no box).
“O Marco Temporal e outras questões de mineração e terras indígenas são assuntos complexos e conflituosos, porque envolvem lutas de séculos e diversos interesses econômicos e sociais” – Geóloga Suzi Huff Theodoro, professora UnB e diretora da Febrageo.
Ponto de vista
O Marco Temporal está avançando, mas é uma de muitas outras propostas que surgiram pela brecha da falta de regulamentação do Art. 231 da Constituição, que trata desse tema. “Ao longo dos anos, mais de 100 projetos de lei e propostas legislativas tentaram, de alguma forma, regulamentar esse assunto e explicita que as terras são direito originário das populações que as ocupam. Portanto, são terras sob a jurisdição da União, cabendo a ela o poder de concessão”, explica Suzi.
Para além de regulamentar esse artigo, a pesquisadora acredita que é fundamental conhecer a geodiversidade presente nas terras indígenas por meio de levantamentos das reais possibilidades relacionadas à presença de bens minerais. Esse levantamento deve ser feito por um órgão oficial do governo brasileiro como, por exemplo, o Serviço Geológico do Brasil. De posse do potencial das áreas, pode-se qualificar as decisões dos povos indígenas – que devem ser protagonistas no debate – no que se refere às decisões acerca de permissão ou não da mineração em suas terras. Ampliam-se, assim, as possibilidades de consideração dos aspectos sociais, culturais, econômicos e ambientais, em caso de permissão da exploração mineral. É provável que se confirme a presença de minerais estratégicos e com alto valor, tais como a cassiterita, nióbio, terras raras entre outros. É preciso pensar estrategicamente a forma (e as possibilidades ou não de se conduzir um processo de exploração dessas riquezas, não somente por questão de soberania nacional, mas, também, como mecanismo de proteção dos povos que habitam as últimas fronteiras de preservação da sociobiodiversidade”, afirma a professora.
Nesse sentido, segundo ela, também é possível considerar que se pode criar áreas livres de mineração. “Ao longo de uma outra pesquisa da Febrageo, Suzi menciona que foi possível averiguar que vem crescendo, entre a nova geração de profissionais da área, um posicionamento mais favorável à mineração mais sustentável, o que estaria alinhado com o argumento do conceito de rigidez socioambiental. Vele dizer que em alguns casos é mais importante preservar uma determinada região com seu grupo social do que ampliar as áreas de mineração. E isso é interessante, porque traz impacto direto no aumento do campo de trabalho destes profissionais, mas que ainda assim consideram importante a preservação”, salienta.
Já para o professor, Geólogo e conselheiro do Crea-PR, Abdelmajid Hach Hach, é possível a atividade minerária acontecer em terras indígenas, mas com regulamentação adequada, participação direta dos indígenas, dos três poderes – executivo, legislativo e judiciário -, da sociedade civil organizada e seguindo os conceitos do ESG (Environmental, Social and Governance), ou seja, governança ambiental, social e corporativa. O assunto foi conteúdo do evento: ESG na mineração, que aconteceu em junho e que foi organizado pelo conselheiro com apoio da Febrageo.
ESG
“Se tivermos leis adequadas, fiscalização e empresas sérias que seguem os conceitos do ESG fazendo a mineração de forma controlada, todos são beneficiados”, afirma Hach. A questão, salienta, é que hoje a “porteira está aberta” e abre espaço para garimpo ilegal e uma série de irregularidades que trazem prejuízos ambientais, sociais e financeiros.
Para o professor, Geólogo e presidente da Febrageo, Caiubi Emanuel Souza Kuhn, o conceito ESG pode e deve ser utilizado por empresas das mais variadas atividades econômicas, mas no caso da mineração é uma pauta muito interessante porque é uma atividade industrial fundamental para a sociedade e que utiliza os recursos naturais do planeta, que são limitados.
“E observamos que a atividade mineral, mesmo sendo muito antiga e necessária, ainda enfrenta uma resistência na sociedade. É impossível não ter atividade mineral, que é fundamental para inúmeros produtos utilizados no dia a dia e para o desenvolvimento tecnológico. O importante é que essa atividade seja feita com o máximo de sustentabilidade possível e que atenda a todos os critérios ambientais. E isso precisa ser demonstrado à sociedade. E, neste aspecto, empresas com ESG abrem caminho de diálogo com transparência para a sociedade e também para investidores.
A Advogada Natacia Marinho trabalha com a estruturação de documentos sobre ESG para as empresas e destaca a importância que a transparência em todo o processo traz. “Não só empresas de capital aberto. Mesmo sem acionistas, é importante para as empresas ter os números atualizados e corretos para a correta gestão e atendimento à legislação.”
Livro trata da questão da mineração em terras indígenas
A pesquisa efetuada, de forma voluntária, por um grupo de pesquisadoras(es), resultou na publicação do livro que aborda temas relacionados à mineração.
O livro “Mineração em terras indígenas – desenvolvimento para quem?” sugere que a sociedade brasileira precisa conhecer em maior profundidade a dimensão dos recursos minerais e as consequências das disputas, bem como as diversas perspectivas envolvidas nessa questão. “A publicação tem o intuito de contribuir no debate, de forma que se possa escolher os melhores caminhos. Cada caso é um caso”, informa Suzi, que destaca que o livro reuniu pontos de vista de várias tendências e conhecimentos – geólogos, pesquisadores, indígenas e, também, de mineradores.
Nossa pesquisa baseou-se em dados públicos disponíveis do SIGMINE (Sistema de informações sobre a Mineração), que é gerido pela Agência Nacional de Mineração (ANM), da FUNAI e do IBGE. O livro, apresenta o resultado de uma pesquisa de quase dois anos que evidenciou, entre outras coisa, que existe cerca de 1450 requerimentos minerários que se encontram em sobreposição às terras indígenas, o que equivale a uma área aproximada do Estado do Rio Grande do Norte.
Os dados obtidos pelas pesquisadoras levaram em conta os requerimentos minerários feitos entre 1967 e fevereiro de 2022. “É importante destacar que no art. N.º 231 da Constituição Federal ficou estabelecido que a manutenção da organização social, dos costumes, das línguas, das crenças e das tradições são direitos originários e cabe à União demarcar, proteger e fazer respeitar todos esses direitos. O texto constitucional estabelece que atividades minerais (entre outras) somente poderão ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei (Art. 3º) ressalta Suzi.
O Livro ainda aponta quais são as substâncias minerais mais requeridas nos requerimentos minerários. Em primeiro lugar aparece o ouro com 36%, seguidos por cassiterita (9%), areia (7%) e cobre (6%). As empresas privadas são as maiores demandantes. Autorização de pesquisa e requerimento de lavra garimpeira representam o maior numero de fases dos processos.
Por fim, o livro apresenta alguns casos de possibilidades ou de resultados da exploração mineral em terras indígenas. “Não tivemos a pretensão de trazer um consenso ou uma verdade, mas sim de contribuir para que se pense em solução de conflitos, de forma que os ganhos e as perdas sejam proporcionais aos diferentes atores envolvidos nestes embates, afirma a professora Suzi Huff Theodoro.
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